As recentes derrotas do governo no Congresso Nacional reacenderam os debates sobre a capacidade de articulação política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e levantaram questionamentos sobre a viabilidade eleitoral do petista nas eleições de 2026. O chefe do Executivo tem dado sinais de que pretende concorrer ao quarto mandato, “se tiver boas condições de saúde”. Assim, segue sem abrir espaço para um eventual herdeiro político no partido e na esquerda.
Especialistas em marketing político ouvidos pelo Correio destacam que o desgaste na imagem pública de Lula é visível e contruibui para o cenário de desaprovação majoritária entre o eleitorado. É o que mostra, por exemplo, a pesquisa MDA/CNT: 52,9% da população desaprova o desempenho de Lula, contra aprovação de 40,7%. O levantamento mostra que, apesar da leve redução na desaprovação em relação a fevereiro, a avaliação negativa predomina, em meio à percepção de um governo fragilizado e com dificuldade para articular com o Legislativo.
Marqueteiros alertam que Lula enfrenta um desafio estrutural em sua estratégia de comunicação e na condução política do atual mandato e, provavelmente, na corrida eleitoral em 2026.
Marcelo Vitorino, especialista em marketing digital, avalia que a postura do presidente está desalinhada com o atual cenário político. “Naqueles [dois primeiros mandatos], havia maior diversidade política nas pastas ministeriais, o que favorecia articulações mais amplas. Já neste terceiro mandato, Lula foi eleito por uma margem estreita, e sua postura tem sido mais alinhada ao petismo. Esperava-se um governo mais plural, capaz de atrair também os eleitores não ideológicos”, observa.
Vitorino ressalta que o presidente tem dificuldades em sair do espectro ideológico que o consagrou. Essa escolha — de falar principalmente para a base progressista — tem limitado sua capacidade de governar para além do próprio campo. “Lula já não é mais visto como o grande conciliador de antes. Sua postura atual repete, em direção oposta, a lógica de Bolsonaro: fala para dentro de seu campo ideológico”, afirma. Além disso, ele aponta um esgotamento do eleitorado com o ambiente de polarização. “A política brasileira vive, desde Bolsonaro e agora sob Lula, em um eterno clima eleitoral. Nenhum deles desceu do palanque, o que resulta em alta rejeição para ambos”, completa.
Desarticulação
Emerson Saraiva, publicitário e consultor político, considera o enfraquecimento da imagem de Lula como articulador fruto de dois movimentos principais no Congresso: o embate sistemático da oposição e o aumento do fisiologismo na base aliada. “Existe uma postura cada vez mais fisiologista dos parlamentares que apoiam o governo, pela valorização que tem o papel desses parlamentares na sustentação de um governo com baixíssimos índices de aprovação”, explica.
Saraiva destaca que Lula tem enfrentado dificuldades para manter a imagem de estadista que o ajudou a vencer em 2022. “Ele construiu uma imagem de estadista, que trabalha com todos pelo bem do país, mas tem uma postura bem diferente em relação aos seus opositores mais ferrenhos, não apenas nos atos, mas principalmente, no discurso.”
De acordo com o estrategista, a forma como Lula se comunica hoje não é suficiente para conter a ofensiva da oposição, que se articula principalmente nas redes sociais. “Várias crises enfrentadas pelo governo que tiveram como principal elemento a força comunicacional da oposição não apenas não foram resolvidas como foram agravadas pela forma como Lula e seus apoiadores reagiram”, afirma Saraiva.
Apesar de Lula sinalizar que não pretende abrir mão da candidatura para a reeleição, especialistas alertam que o caminho até lá será árduo. Mas a dificuldade de articulação do atual governo no Congresso Nacional, somada ao enfraquecimento da imagem pública de Lula, pode inviabilizar uma candidatura competitiva do petista, segundo especialistas.
Saraiva acredita que o presidente se aproxima de um dilema estratégico, se insistir em ações que não funcionam e que podem comprometer ainda mais a imagem dele. Vitorino, por sua vez, vê uma oportunidade para lideranças fora do eixo polarizado. “Há uma oportunidade clara para quem quiser romper com o partidarismo e reconectar a política com as reais demandas sociais”, avalia o publicitário.
As dificuldades de articulação política e o desgaste da imagem pública de Lula também têm sido explorados pela oposição no Congresso. O deputado federal Hélio Lopes (PL-RJ), por exemplo, atribuiu as recentes derrotas do governo à falta de organização interna.
“Já estava na cara que não iria passar aqui na Câmara. É um tributo, e o governo só pensa em taxar, dificultando a renda do brasileiro. Falaram que iam ter 300 votos de vantagem. Provamos que quem manda é o Parlamento”, afirma, em referência à rejeição do decreto que aumenta o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Lopes também critica a condução da base aliada, destacando que “nem os partidos que o presidente considera aliados conseguiram segurar”. Ao comentar sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) sobre o escândalo no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), declara esperar que o colegiado exponha irregularidades nos descontos a aposentados e que os culpados sejam punidos.
Na defesa do governo, a deputada Érika Kokay (PT-DF) minimiza o impacto político das derrotas no Legislativo e afirma que elas não representam fraqueza do Executivo, mas, sim, “imposições contra o povo brasileiro”. Segundo a parlamentar, há uma resistência por parte da oposição em aprovar medidas de justiça tributária. “Eles têm uma resistência imensa de colocar o rico no Orçamento. Eles são contra taxar as grandes fortunas”, ressalta. “Quando dizem ‘nenhum imposto a mais’, é nenhum imposto para quem tem muito dinheiro no Brasil.” A petista reforça que o governo tem compromisso com o equilíbrio fiscal, desde que atrelado à justiça social, e defende que rico pague mais Imposto de Renda.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Ricardo Stuckert / PR