Com atuação em Ceilândia e de origem mineira, a educadora e produtora cultural Thânisia Cruz, coordenadora do Comitê da Marcha das Mulheres Negras do Distrito Federal, compartilhou suas reflexões sobre a luta das mulheres negras por igualdade de gênero e de raça durante a sua participação no
Podcast do Correio Braziliense, realizado na última sexta-feira (21/11). No programa, ela destacou os pontos essenciais da
2ª edição da Marcha das Mulheres Negras, que ocorre na próxima terça-feira (25/11), após 15 anos.
Para esta edição, são esperadas mais de 300 mil mulheres. Às jornalistas Adriana Bernardes e Mannu Leones, Thânisia definiu que a marcha é uma oportunidade de mostrar as reivindicações de direitos para as mulheres negras. “Estamos produzindo alguns documentos, como o Manifesto Econômico, que faz algumas exigências ao Estado para a construção de uma economia mais justa e inclusiva”, disse.Play Video
Qual o significado dessa marcha, e quais serão as atividades propostas?
Construir uma marcha leva muito tempo. É um período intenso de muita dedicação e um processo de maturação e amadurecimento constante. A primeira marcha tinha como lema Contra o racismo e as violências e pelo bem-viver. A segunda edição tem como lema Reparação e bem-viver. É um chamado para combater o racismo, e não tem como combatê-lo sem ter oportunidades. Essas duas vertentes são muito importantes para conseguir direitos. Além da marcha, temos muitas agendas — regionais e nacionais — de vários coletivos.
Sabemos que muitas mulheres não conseguem se engajar em lutas porque têm que cuidar dos filhos. A marcha também se preocupa com isso?
Nos preocupamos com essa parte da nossa luta também. Temos local para acolher essas crianças. As caravanas também estão organizadas para acolher e cuidar delas. Temos uma parceria com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), que possibilitou a criação de um espaço para acolher essas crianças — cuidoteca. E esse espaço vem justamente para dizer para as mães que há pessoas voluntárias que estão nesse processo de apoiar a luta e cuidar dessas crianças. Elas são super bem-vindas.
A deputada Benedita da Silva está à frente do projeto do Fundo de Reparação. Qual o potencial desse projeto?
A maior expectativa é para que ele possa impulsionar políticas públicas de igualdade racial que estejam em voga, como na saúde, educação e outras áreas. Além disso, o Fundo de Reparação também traz outro ponto muito importante que é a disputa das mulheres negras por representação no Congresso. Atualmente, quem são essas pessoas que estão tomando as decisões para milhares de pessoas? Há pouca quantidade de mulheres negras ocupando esses espaços. Por isso, esse projeto é tão importante.
Outra questão interessante de abordar sobre a ocupação de lugares de poder foi a recente indicação do presidente Lula, no Dia da Consciência Negra, do ministro Jorge Messias para o STF. Como você enxerga isso?
É uma página que continua aberta. Há muitos manifestos que solicitam e apontam que não há uma justificativa sobre a ausência de mulheres negras no STF. Existem vários nomes a serem indicados, inclusive com listas que rodam em diversos coletivos Brasil afora. Estamos em 2025, e isso aconteceu novamente. A primeira coisa que aprendemos depois de muito tempo na universidade é que a ciência não é neutra, ela faz escolhas. A justiça também faz escolhas. Há nuances dentro das decisões que precisam ser respeitadas. Só uma mulher sabe o que é ser uma mulher, só uma mulher negra sabe os desafios que passa por ser mulher negra. Só uma mulher trans sabe o que é ser mulher trans.
As mulheres negras ainda não estão em cargos de poder. Como esse cenário pode ser revertido?
Eu sinto que essa resposta virá no dia 25, durante a marcha. O que pode ser percebido é que, na época da nossa primeira marcha, não havia muitos institutos e casas culturais. Agora, podemos ver muitos jovens e muitos coletivos que são montados e vão para a base do movimento, agregando e construindo nossa luta. No Distrito Federal, há muitos exemplos, como o Periféricos do Topo, no Pôr do Sol, que ocupa uma praça pública na região. Há uma conexão muito forte entre as pessoas desse projeto e a população.
Como você vê a autorização que a Anvisa concedeu à Embrapa para realizar pesquisas com canabidiol?
Sabemos que existe um preconceito muito grande em relação a jovens periféricos e a jovens negros, sobretudo, rapazes mais jovens. Muitas vezes, essa violência policial, além de ser carregada de preconceito, também atinge e interfere nos estudos sobre a própria planta. Eu acredito que é uma conversa que vem de algum tempo, principalmente, no campo da saúde, e eu acredito que a pesquisa e uso dessa substância ajudam muito em pessoas que possuem neurodivergência. Há exemplos que vejo na minha família e em pessoas ao meu redor que começaram a usar o canabidiol, com permissão e acompanhamento médico, que apresentaram muitas melhoras. O racismo na saúde é um limitador para diagnósticos.
Pegando o embalo da COP30, como a crise climática atinge de forma mais severa as pessoas negras e periféricas?
Quando discutimos sobre racismo ambiental, estamos falando da moradia e do local onde essas pessoas moram. Por exemplo, uma enchente que atinge a UnB afeta toda a sociedade. O importante, nesse sentido, é observar como essa enchente atinge uma pessoa do Sol Nascente que, muitas vezes, não tem condições de recuperar tudo aquilo que perdeu. Em termos de justiça climática, temos que pensar de uma forma coletiva para tomar decisões assertivas que não destruam os seres humanos. Por isso, precisamos de mais representantes negros e periféricos que são vulnerabilizados e vilipendiados.
Programação
Data: 25 de novembro de 2025
Local: Concentração em frente ao Museu Nacional, a partir das 7h
Marcha: Do Museu Nacional até o Congresso Nacional
9h – Sessão Solene no Congresso Nacional, em homenagem à marcha e ao papel decisivo das mulheres negras na democracia brasileira.
10h – Marcha pela Esplanada dos Ministérios.
15h – Shows gratuitos na área externa do Museu Nacional.
19h30 – Representantes da marcha serão recebidas em audiência pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Edson Fachin.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Wanderlei Pozzembom CB/DA Press