O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, proferiu despacho ontem no qual esclarece pontos da sua decisão da véspera sobre a impossibilidade de aplicar lei de outros países ao Brasil. Mas isso não foi capaz de acalmar os bancos nacionais ou que operam no setor interno, cujas ações derreteram no fechamento do Ibovespa. Itaú, Santander, Bradesco, Banco do Brasil e BTG Pactual perderam, juntos, em torno de R$ 42 bilhões em valor de mercado.
O que preocupa as instituições é um trecho da decisão de Dino sobre o alcance da Lei Magnitsky — pela qual o governo dos Estados Unidos sanciona agentes de regimes autoritários, indivíduos envolvidos em corrupção, líderes de organizações criminosas, militares e oficiais de segurança e empresas e entidades envolvidas em crimes transnacionais. Embora sem citá-la, segundo o ministro “transações, operações, cancelamentos de contratos, bloqueios de ativos, transferências para o exterior (ou oriundas do exterior) por determinação de Estado estrangeiro” dependem de autorização do STF.
Como alguns dos principais bancos brasileiros têm filiais nos Estados Unidos, há um conflito legal relacionado a investimentos e produtos — cartões de crédito, por exemplo. Como as principais bandeiras são de origem norte-americana, paira a incerteza sobre a aplicação da suspensão do acesso a elas, no Brasil, ao ministro Alexandre de Moraes, devido à sanção a ele imposta pelo governo de Donald Trump.
As instituições brasileiras tendem a suspender os cartões emitidos em nome do magistrado para que não sofram punições de Washington. Em situação-limite, caso descumpram a determinação do governo norte-americano, os bancos podem ter a permissão para operar no mercado dos EUA suspensa. O funcionamento no país é burocrático e submetido ao controle de organismos, como Federal Reserve (Fed, principal regulador federal para a maioria das operações das instituições não norte-americanas), Office of the Comptroller of the Currency (OCC, que concede e supervisiona as licenças para filiais e agências com autorização federal) Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC, responsável por segurar os depósitos de clientes) e entidades estaduais de regulação (por serem os EUA uma confederação, cada unidade tem seu próprio órgão de acompanhamento, que licencia e supervisiona as operações dentro de sua jurisdição).
Na decisão de segunda-feira, o ministro deixa claro que uma lei como a Magnitsky não vale no Brasil. “Trata-se de decisão que reitera conceitos básicos e seculares, destinada a proteger o Brasil — abrangendo suas empresas e cidadãos — de indevidas ingerências estrangeiras no nosso território. Ademais, a decisão atende a imperativos elementares de segurança jurídica, pois seria inviável a prática de atos jurídicos no Brasil se — a qualquer momento — uma lei ou decisão judicial estrangeira, emanada de algum país dentre as centenas existentes, pudesse ser imposta no território pátrio. Obviamente não se cuida de ‘escolher o que cumprir’, e sim de uma derivação compulsória do atributo da soberania nacional, consagrado pela Constituição Federal e posto sob a guarda dos Três Poderes da República”. A manifestação de Dino foi no âmbito de uma ação movida pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) contra contratos firmados entre escritórios de advocacia do Reino Unido e municípios brasileiros.
Ao esclarecer sua decisão, o ministro frisa que sobre a aplicação ou validade leis estrangeiras no Brasil nada há nada a esclarecer. “Em relação aos aspectos atinentes a leis estrangeiras e demais atos jurídicos estrangeiros, nada há a adicionar a título de esclarecimento, permanecendo íntegra a decisão proferida em 18 de agosto”, afirmou. Segundo Dino, tribunais internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos ou o Tribunal Penal Internacional, não estão incluídos na decisão.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Fellipe Sampaio/STF