O governo federal prepara reações tanto políticas quanto econômicas à dura derrota, na Câmara, com a Medida Provisória do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que caducou e perdeu a validade na quarta-feira. Se, de um lado, congressistas ligados ao Planalto tentam inflamar seus seguidores nas redes sociais para voltar a defender o que chamam de tributação BBB (bancos, bets e bilionários), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que é uma questão de dias até que os bilionários comecem a pagar “o imposto que merecem”.
O plano de reação será traçado com ministros na próxima semana, quando Lula retorna a Brasília. Depois da viagem à Bahia, ontem, o presidente chega hoje a São Paulo para participar de um evento que anunciará um novo modelo de crédito imobiliário. Embora a estratégia ainda não tenha sido fechada, ele disparou contra as fintechs. “(Na próxima semana) vou reunir o governo para discutir como é que a gente vai propor que o sistema financeiro, sobretudo as fintechs — que tem fintech hoje maior do que banco — paguem o imposto devido a esse país”, disse, em entrevista à rádio Piatã, da Bahia, ontem. Lula retorna a Brasília dia 15.
Pouco depois, na inauguração da unidade da fabricante chinesa de veículos BYD, em Camaçari (BA), o presidente destacou que os setores que seriam afetados se recusaram a bancar um aumento de taxas com alíquotas de até 18%, enquanto trabalhadores brasileiros pagam até 27,5% de Imposto de Renda. “Ontem (quarta-feira) foi triste, porque uma parte do Congresso Nacional votou contra a taxação que a gente queria fazer dos bilionários deste país, daqueles que ganham muito e pagam pouco. E vocês não podem ficar quietos”, exortou.
“Se um trabalhador pode pagar 27,5%, por que um ricaço não pode pagar 18%? Ainda fizemos acordo para 12%, e eles não quiseram pagar. Eles podem saber, que é uma questão de dias. Eles vão pagar o imposto que merecem aqui no Brasil, porque o povo trabalhador não vai deixar isso barato. Não derrotaram o governo, derrotaram o povo brasileiro. Derrotaram a possibilidade de melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro tirando mais dinheiro dos ricos e distribuindo para os pobres”, criticou.
No Congresso, além de acusar a oposição de defender ricos e banqueiros, parlamentares começaram a apresentar propostas para compensar a arrecadação perdida com o sepultamento da MP do IOF. Foi o caso do líder do PT, deputado Lindbergh Farias (RJ). Em um projeto de lei apresentado ontem, propôs aumentar de 12% para 24% a taxação sobre a receita bruta de bets. No texto da finada MP, o governo havia previsto que essa alíquota seria de 18%.
Questionado sobre as alternativas para compensar a frustração de arrecadação, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) criticou o que chamou de “uma série de especulações” sobre o assunto. Disse que em 15 de outubro levará “vários cenários” a Lula em busca de uma definição. “Vamos dar esse tempo para avaliar com muito cuidado cada alternativa. Vamos conversar também com o relator do Orçamento (deputado Ângelo Coronel, PSD-BA), porque isso tem impacto orçamentário importante em emendas, em investimentos”, explicou.
No fim da tarde, o Ministério da Fazenda confirmou que Haddad vai seguir em Brasília, na próxima semana, para a reunião com Lula. Anteriormente, o ministro tinha viagem marcada para os Estados Unidos, onde participaria das Reuniões Anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird), além da Trilha Financeira do G20. Também havia expectativa de um encontro com o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, para discutir o tarifaço de 50% que o governo de Washington impôs às exportações brasileiras.
“Tiroteio”
Haddad aproveitou, ainda, para retomar as críticas ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), por ter articulado a derrubada da MP do IOF. Disse, no entanto, que vai manter a sobriedade nas relações institucionais com o governador e com o estado. “Vamos agir para atender os anseios dos paulistas da mesma maneira que fizemos até aqui”, garantiu.
Embora o ministro tenha baixado o tom sobre Tarcísio, nomes influentes no governo continuaram as críticas ao governador em redes sociais e entrevistas. A ideia é associá-lo à derrubada da MP no momento em que São Paulo vive uma crise sanitária com os casos de metanol adicionado em bebidas fasificadas. O senador Humberto Costa (PT-PE) chegou a publicar uma montagem de Tarcísio abraçado ao mascote de um jogo de azar. “Um gatinho para atuar pelos interesses do povo de São Paulo e um tigrão para defender bet e bilionário”, provocou.
A ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), também particu para cima de Tarcísio. “É vergonhoso o governador fingir que não atuou para sabotar a MP 1.303, quando até o líder da oposição (na verdade o líder do PL, o deputado fluminense Sóstenes Cavalcante, em entrevista à Globo News) agradeceu a ele. O que Tarcísio quer esconder do eleitor é que ele é o candidato dos bilionários, das bets e dos golpistas. Não pensa no povo nem no país”, acusou.
Em um vídeo nas redes sociais, Tarcísio rebateu os ataques. Disse ser vítima de uma campanha de “desconstrução de imagem” e alfinetou Haddad. “Paciência tem limite. Há meses, a gente vem sendo alvo de uma ampla campanha de desconstrução de imagem, reputação, por parte do PT. Ofensas, mentiras nas redes sociais. Ficar jogando uns contra os outros, de forma absurda, e querer que a população apoie aumento de impostos — e eram 10 impostos que seriam aumentados ontem —, ninguém — nem eu, nem o país — vai apoiar. Já chega. Vamos parar de inventar culpado. Tenha vergonha, Haddad. Respeitem os brasileiros. Cortem gastos”.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Ricardo Stuckert/PR