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Evento celebra um ano da incorporação de medicamento no SUS para tratamento de fibrose cística

A fibrose cística é uma doença genética grave, caracterizada pela produção de muco...

A fibrose cística é uma doença genética grave, caracterizada pela produção de muco espesso e que afeta o funcionamento de diversos órgãos – em especial, o pulmão. Crianças diagnosticadas com a doença encontram atendimento no Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB), que oferece cuidado multidisciplinar, acesso a exames e às medicações necessárias para que o paciente tenha qualidade de vida. Na quarta-feira (30), o HCB promoveu evento que marcou um ano desde a inclusão da principal medicação para tratamento da doença, no Sistema Único de Saúde (SUS).

O medicamento é indicado para crianças, a partir dos 6 anos de idade, com uma alteração genética específica entre as que causam a fibrose cística. Formado pela união de três moléculas (elexacaftor, tezacaftor e ivacaftor), ele atua em nível celular. “A mutação cria uma proteína, chamada canal de cloro, defeituosa. Essa proteína é como uma porta que não se abre ou que não existe, não regula a passagem do cloro; o medicamento age como se fosse um marceneiro, que conserta a porta e ela passa a abrir. Ele é um modulador da proteína”, explica a médica coordenadora do serviço de pneumologia do HCB, Luciana Monte.

A cerimônia contou com a presença da referência técnica distrital de pediatria da Secretaria da Saúde do Distrito Federal (SES-DF), Juliana Queiroz; do representante do Registro Brasileiro de Fibrose Cística (REBRAFC), Luiz Vicente da Silva Filho; e do presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Ricardo Corrêa, além da diretora executiva do HCB, Valdenize Tiziani. A diretora executiva do Instituto Unidos Pela Vida, Verônica Stasiak, e a representante do Grupo Brasileiro de Estudos de Fibrose Cística (GBEFC), Elenara Procianoy, participaram virtualmente.

Também chamada de muscoviscidose, a fibrose cística tem sintomas como sinusite crônica, pneumonia e produção de suor salgado, além de levar a quadros de desnutrição e diabetes. Como o medicamento melhora a função do canal de cloro, traz qualidade de vida ao paciente: com o muco hidratado, sintomas clínicos – como a tosse crônica, as infecções e a função pulmonar – ficam próximos ao que se considera normal; também há melhora nutricional e alguns países relatam melhora da fertilidade em pacientes adultos. Monte também relata que “os pacientes que usam o medicamento têm saído das listas de transplante pulmonar e têm menos necessidade de oxigênio”.

Durante o evento, a pneumologista apresentou dados do próprio HCB que confirmam esses resultados internacionais. 91,9% dos pacientes do Hospital que fazem uso do medicamento apresentaram redução dos sintomas; três crianças, que tinham indicação de transplante de pulmão saíram dessa indicação. Também houve melhora no uso de ventilação: os pacientes que utilizavam oxigênio contínuo 24h não precisam mais desse apoio para respirar (uma criança segue com a ventilação, mas apenas durante o sono).

Os bons resultados, no entanto, não são sinônimo de uma cura; sem a medicação, todos os sintomas retornam. “O paciente vai se sentir ótimo, mas isso não significa que ele está curado. É como a hipertensão: uma doença grave, mas que tem controle com a medicação”, compara Monte.

O presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Ricardo Corrêa, considera a medicação uma revolução: “Temos experiência com a população adulta de fibrose cística e observamos uma revolução absurda na evolução dos pacientes, vida plena – com saúde, autonomia, participação na vida social”.

Segundo a diretora executiva do HCB, Valdenize Tiziani, a luta até a incorporação do medicamento se alinha ao compromisso do Hospital em oferecer atendimento de excelência aos pacientes, de forma integrada com a rede pública de saúde. “O Distrito Federal tem o melhor programa de triagem neonatal, conduzido pelos colegas do Hospital de Apoio, e essa é uma grande diferença: desde o início do Hospital, recebemos as crianças dentro de um programa. Imediatamente, realizamos os testes confirmatórios para que possamos ter o diagnóstico fechado e o tratamento da criança”, relata.

Conquista para os pacientes

O medicamento foi incorporado ao SUS por meio da portaria SECTICS/MS Nº 47, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. A decisão foi publicada em 2023, mas estabelecia março/2024 como prazo final para que as áreas técnicas efetivassem a oferta da medicação.

“A incorporação foi graças a associações de pacientes, em especial a Unidos pela Vida; à comunidade científica, principalmente o Grupo de Estudos em Fibrose Cística e a Sociedade Brasileira de Pneumologia”, relata Luciana Monte. A pneumologista do HCB ressalta, ainda, a importância do Registro Brasileiro de Fibrose Cística (REBRAFC).

Ricardo Corrêa, representante do REBRAFC, explica que o Registro reúne dados desde 2009. “Temos dados mais confiáveis e precisos sobre a situação do diagnóstico e tratamento das pessoas que têm fibrose cística. Isso ajuda muito o Ministério da Saúde a se planejar para entender qual vai ser o impacto orçamentário, por exemplo, da introdução de uma nova tecnologia de saúde, um tratamento novo para esses pacientes”, explica Corrêa.

A visão dos pacientes sobre o medicamento também foi apresentada durante o evento. Marina Ferreira e Humberto de Medeiros são pais de Ana Beatriz de Medeiros, nove anos, e separam o tratamento da filha em três fases. A primeira, antes do diagnóstico, foi comparada às dificuldades de voo enfrentadas por um avião teco-teco; quando o diagnóstico foi confirmado e a família começou a ser acompanhada pela equipe multidisciplinar do HCB, a experiência evoluiu para um bimotor, que tinha mais recursos para voar. “Um dia, aparece o medicamento na sua vida e aquele bimotor transforma-se num jatinho; você vai para qualquer lugar tão rápido quanto qualquer avião e até se esquece dos perrengues que já passou voando”, compara Humberto.

Já a jovem Kamylle Nascimento, 17 anos, emocionou os participantes do evento ao relatar como o medicamento a retirou de uma rotina constante de hospitalizações. “Comecei a tomar o medicamento na minha penúltima internação. Antes dele, eu não tinha qualidade de vida, não tinha sonhos, não tinha nada. Graças ao SUS, consegui o remédio e, agora, tenho sonhos. Eu fui para a escola; saio com minhas amigas, com meus familiares, estou até namorando”. A paciente do HCB garante: “O medicamento salvou a minha vida e a da minha irmã, que também tem fibrose”.

Durante o evento, os participantes expressaram a importância de expandir o uso do medicamento (que, nos Estados Unidos, já é receitado a crianças a partir de dois anos de idade) e de buscar outros moduladores da proteína que causa a fibrose cística. “É sempre importante celebrar as conquistas e a vida, reconhecer que muito foi feito até chegarmos a esse momento. Também temos que saber que a estrada é bastante longa e não vamos parar até que todos tenham tudo que há de melhor para viver – reconhecendo e respeitando, claro, todas as questões necessárias de avaliação e de regulação”, diz a diretora executiva do Instituto Unidos Pela Vida, Verônica Stasiak.

*Com informações do HCB

Por Revista Plano B

Fonte Agência Brasília

Foto: Jonathan Cantarelle/Agência Saúde-DF

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