Embalado pela gradual recuperação da popularidade, apontada por pesquisas de opinião, além da aproximação com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil “está arrumado” e chamou o antecessor, Jair Bolsonaro, de “tranqueira”.
As declarações ocorreram durante o lançamento de um novo modelo de financiamento imobiliário da Caixa Econômica Federal (CEF), em São Paulo. Em discurso repleto de críticas à gestão anterior, Lula fez uma leitura sobre os retrocessos que o país viveu desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e incluiu na conta os governos de Michel Temer e Bolsonaro.
Lula também falou sobre a herança orçamentária deixada por Bolsonaro, afirmando que foi obrigado a lançar mão de uma proposta de emenda à Constituição para reorganizar as contas públicas e garantir recursos mínimos de governabilidade. “A gente teve que fazer uma coisa chamada PEC da Transição, que não deve ter no dicionário brasileiro, porque não existe, para ter dinheiro para governar. Porque a tranqueira que governava não cuidou disso”, ironizou, arrancando aplausos da plateia.
Ele disse que o país precisa “de uma nova chance” para seguir em frente. “Vocês percebem que as coisas demoram para acontecer no Brasil? Muitas vezes, a gente consegue andar um quilômetro para frente e, quando a gente menos espera, volta dois quilômetros. Vocês têm noção da destruição que este país sofreu nos últimos seis anos?”, declarou.
O chefe do Executivo também criticou o clima de desconfiança em torno da política econômica e a falta de reconhecimento, segundo ele, dos avanços conquistados em 2023 e 2024. “Existe uma indústria de jogar desconfiança na sociedade brasileira”, afirmou. Acrescentou que seu governo é o que mais trata do tema fiscal com responsabilidade, justamente para “não passar a vida inteira respondendo a processo” por negligência administrativa.
O petista citou a saída do Brasil do Mapa da Fome, da Organização das Nações Unidas (ONU), e disse que os resultados sociais voltaram a aparecer, mas que ainda há resistência de parte do Congresso. “O país está arrumado”, afirmou, reforçando que o Brasil precisa de estabilidade política e econômica para consolidar os avanços sociais.
Em seguida, o presidente voltou a criticar a rejeição, pelo Congresso, da Medida Provisória (MP) 1303/2025, que previa alternativas à elevação do IOF e aumentaria a arrecadação.
“A necessidade de continuar fazendo política de inclusão social é para fazer as pessoas subirem um degrau a mais na escala social, e criarmos uma espécie de sociedade de classe média. Mas é neste país que a gente manda um projeto acordado no Congresso Nacional, para que pessoas que ganham mais de R$ 600 mil, R$ 1 milhão, paguem uma merrequinha a mais; as fintechs e as bets, e eles votam contra, porque o dinheiro poderia servir para fazer mais política de inclusão”, lamentou.
Trump
No fim do discurso, Lula comentou sobre o tarifaço a produtos brasileiros, imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ele defendeu uma política externa independente e de respeito mútuo entre as nações. Ressaltou que o Brasil não pode depender do “humor de um presidente” estrangeiro e deve ampliar seus mercados. “Se os americanos não quiserem comprar os produtos brasileiros, as empresas podem vender para a China, na Ásia, em qualquer país do mundo”, sustentou.
O chefe do Executivo concluiu ressaltando que “no mundo, ninguém respeita quem não se respeita”. “Se acha que lamber botas te ajuda, vai cair do cavalo. As pessoas só te respeitam quando percebem que tem autoridade moral e caráter.”
O discurso ocorreu um dia após a divulgação da pesquisa Genial/Quaest, que mostrou empate técnico entre aprovação (48%) e desaprovação (49%) do governo, o melhor índice de 2025. O levantamento também indicou que Lula ampliou a vantagem sobre Tarcísio de Freitas (Republicanos) em um eventual cenário para 2026, subindo de 8 para 12 pontos.
“Vamos com tudo”
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), comemorou o resultado da pesquisa e criticou a oposição por barrar a MP da taxação dos “bancos, bets e bilionários”. “Vocês morrem de medo de Lula. O que vocês fizeram foi covardia, vocês estão atirando contra o Brasil. Vocês deram um tiro no pé”, afirmou. O parlamentar acrescentou que a base petista segue mobilizada: “A maior parte do povo brasileiro está com o presidente. Vamos com tudo, Lula”, concluiu.
Para o cientista político Pedro Hermílio Villas Bôas Castelo Branco, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a melhora na aprovação de Lula expressa a leitura positiva da sociedade sobre a coerência e a firmeza do governo em temas centrais como soberania, democracia e política externa.
Segundo ele, a defesa da independência dos Poderes e a postura altiva diante dos Estados Unidos reforçaram a imagem de liderança. “A melhora da aprovação do Lula na pesquisa da Quaest e a diminuição da rejeição que parece empatar agora com a aprovação demonstram que as ações do governo vêm sendo muito coerentes no que diz respeito à defesa da soberania, no contexto da imposição de tarifas de 50% ao Brasil”, frisou.
O pesquisador também destacou que a diplomacia brasileira tem se mostrado mais autônoma e eficaz. Ele avaliou que a relação direta entre Lula e Donald Trump “quebrou o monopólio da comunicação”, antes concentrado no deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Ainda ressaltou que a atitude firme do presidente contribuiu para consolidar apoio interno.
“O fato de o Lula não ter baixado a cabeça, de ter agido com altivez, defendido a soberania nacional e mantido um discurso coerente fez com que ele distoasse da maioria dos líderes mundiais. Isso parece estar sendo lido e recebido por diferentes segmentos da sociedade civil e se espelha numa melhora da aprovação do governo e nas chances de vencer as eleições de 2026”, observou.
O professor ressaltou que medidas de impacto econômico e simbólico também contribuíram para o avanço da imagem do governo, como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e a reação social contra propostas como a PEC da Blindagem e a anistia a golpistas.
“O Brasil tem um conflito distributivo perverso, em que os mais pobres e a classe média pagam mais impostos do que os mais ricos. A isenção é uma conquista sem precedentes. E as manifestações contra a PEC da Blindagem e contra a anistia mostraram o apoio da sociedade à democracia”, destacou. “Mesmo com um Congresso desfavorável, o governo vem conseguindo implementar políticas que alteram questões estruturais, e isso se reflete na queda da rejeição e no fortalecimento da democracia”, concluiu.
*Estagiário sob a supervisão de Cida Barbosa
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil