Bebida milenar conhecida por propriedades medicinais e antioxidantes, o chá-verde pode ajudar a melhorar a sensibilidade à insulina e modular o metabolismo muscular em condições de obesidade — mesmo quando eliminados fatores externos que interferem no gasto energético, como a exposição ao frio. Conduzido por pesquisadores da Universidade Cruzeiro do Sul (SP) com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), um estudo publicado na revista Cell Biochemistry and Function indica que os compostos bioativos da planta Camellia sinensis, em especial as catequinas, exercem efeitos benéficos no organismo para o controle da glicemia e o equilíbrio entre o ganho e a perda de energia.
O chá-verde é, tradicionalmente, associado à prevenção de doenças metabólicas e já havia demonstrado efeitos positivos sobre a resistência à insulina e a inflamação em modelos animais obesos. A novidade, agora, está no fato de os experimentos terem sido realizados em condições de termoneutralidade (28 °C) — temperatura na qual os animais não precisam gastar energia adicional para manter o calor corporal. Isso elimina um fator que costuma mascarar resultados de estudos metabólicos: o estresse térmico causado por ambientes frios.
“O frio excessivo ativa mecanismos regulatórios compensatórios no organismo dos animais, fazendo com que eles gastem mais energia para se manterem aquecidos. Isso pode mascarar os reais efeitos de qualquer substância”, explica a bióloga Rosemari Otton, autora sênior do trabalho. “Se os animais estiverem em um ambiente mais frio, o efeito do chá é potencializado pela ativação do gasto energético devido à baixa temperatura. Mas, ao manter a termoneutralidade, conseguimos observar os efeitos do chá-verde sem interferência ambiental”, explica.
Extrato
Na pesquisa, camundongos machos foram alimentados com dieta rica em gordura durante quatro semanas, para induzir obesidade. Em seguida, parte dos animais recebeu diariamente extrato da bebida por 12 semanas, enquanto eram mantidos na temperatura neutra. No fim do experimento, os pesquisadores fizeram testes de tolerância à glicose e à insulina, além de análises detalhadas do tecido muscular.
Os animais tratados com chá-verde tiveram melhora significativa no controle da glicemia e na sensibilidade à insulina em comparação aos obesos que não receberam a substância. Os níveis de glicose em jejum dos primeiros foram semelhantes aos daqueles que receberam dieta-padrão. Além disso, os índices de resistência à insulina, medidos por testes específicos, também se aproximaram dos observados no grupo controle.
Segundo os autores, esse efeito está relacionado à modulação de genes envolvidos na captação e utilização da glicose pelo músculo esquelético, tecido responsável pela maioria dos movimentos do corpo, como a locomoção. “Cerca de 75% da glicose que retiramos do sangue após as refeições é captada pelo músculo esquelético”, lembra Rosemeri Otton. “Por isso, estratégias que melhoram a função desse tecido têm grande impacto na prevenção e no controle do diabetes tipo 2.”
Eficiência
As alterações observadas pelos pesquisadores sugerem que o chá-verde favorece a eficiência energética do tecido muscular e pode contribuir para reduzir a inflamação sistêmica — processo associado ao desenvolvimento de doenças metabólicas. Outra descoberta destacada no artigo foi o aumento da atividade da enzima lactato desidrogenase (LDH) e da expressão de genes relacionados ao metabolismo do glicogênio. Isso indica que a bebida estimula o uso de glicose e a produção de lactato — um processo que, segundo estudos recentes, ajuda a combater a inflamação e melhorar a sensibilidade à insulina.
Embora os resultados sejam promissores, os testes foram realizados em camundongos e ainda precisam ser confirmados em estudos clínicos. Além disso, os pesquisadores destacam a necessidade de investigar possíveis diferenças entre os sexos — todos os animais usados no estudo eram machos — e de explorar mais a fundo o impacto do chá-verde sobre a inflamação no tecido muscular.
Rosemari Otton explica que ainda não há como determinar uma dose eficaz e segura de chá-verde para obter, em humanos, os efeitos observados nos animais, devido à variabilidade dos extratos e ao fato de cada um se comportar de forma diferente. “O ideal é o consumo crônico, como vemos em países asiáticos. No Japão, por exemplo, as pessoas consomem a bebida todos os dias, ao longo da vida, e os índices de obesidade são baixos. Mas isso é diferente de tomar chá por cinco meses e esperar um efeito milagroso na perda de peso”, pondera.
“Beber chá-verde regularmente pode, sim, trazer benefícios para metabolismo da glicose, redução de inflamação e melhora da sensibilidade à insulina, mas em magnitude menor que no estudo, porque a dose equivalente seria muito alta para atingir apenas com infusão”, observa a nutricionista Rejane Souza, do Grupo Mantevida. “Os efeitos dependem de hábitos alimentares, prática de atividade física e quantidade e qualidade do chá (tempo de infusão, concentração de catequinas). Altas doses em forma de suplemento/extrato são estudadas, mas podem causar desconfortos gastrointestinais ou sobrecarga hepática se usadas em excesso”, observa.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Patrick Mansell/Divulgação