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Ciclistas pedem mais estrutura para preservar vidas no DF

Por ser uma cidade plana, arejada e arborizada, Brasília tem potencial para ser atrativa...

Por ser uma cidade plana, arejada e arborizada, Brasília tem potencial para ser atrativa a ciclistas. No entanto, quem usa a bicicleta como um meio frequente de transporte destaca que são necessárias melhorias na infraestrutura da cidade para que o modal seja usado com segurança e liberdade como uma opção de mobilidade sustentável. Especialistas enfatizam que, além de construção de novas vias cicláveis e manutenção da estrutura já existente, é necessária maior conscientização por parte dos motoristas e dos próprios ciclistas para uma convivência segura no trânsito. 

Correio conversou com moradores do DF que utilizam a bicicleta como meio de locomoção e também como esporte ou lazer. É o caso do servidor público George Dantas, 49 anos, que usa o modal para ir ao trabalho entre duas e quatro vezes por semana. O morador de Taguatinga trabalha no Plano Piloto e destaca que se locomover de bicicleta faz bem à saúde e ao bolso.Play Video

“Como tenho crise de ansiedade, ocasionalmente percebo que melhora a respiração, a disposição e o rendimento no trabalho. Os pensamentos fluem melhor e de modo mais assertivo”, afirma George. “As principais vantagens que vejo utilizando a bike como sistema de modal cotidiano são a melhora na qualidade do ar e uma maior economia financeira”, acrescenta.

Entretanto, George acredita que, para melhorar a mobilidade via bicicleta, são necessárias algumas intervenções. “A maior dificuldade que eu vejo é a falta de ciclovias ligando a região central de Brasília às outras regiões administrativas. Hoje, há apenas uma ciclovia na EPTG, que poderia ser ampliada para fazer a ligação com o Parque da Cidade”, sugere.

Segundo o professor, pesquisador em mobilidade urbana e ex-coordenador do Metrô-DF Carlos Penna Brescianini, o Brasil apresenta baixa atratividade para o uso da bicicleta e forte estímulo ao automóvel. “Veja que as estruturas são construídas para automóveis, raramente para pedestres e ciclistas”, afirma.

No Distrito Federal, ele considera o cenário ainda incipiente devido à falta de incentivos. “Um exemplo: quem sai de São Sebastião e pretende ir e voltar ao Jardim Botânico encontrará apenas um trecho com ciclovia devidamente segregada dos automóveis. O restante do percurso exige pedalar entre os carros, o que é perigosíssimo, ou nas calçadas, desviando de pedestres”, lamenta.

De acordo com o especialista, o maior risco para ciclistas são os atropelamentos, que estão entre as principais causas de mortes no trânsito para quem utiliza a bicicleta. 

Segurança

O professor de matemática Pedro Resende, 29, começou a praticar ciclismo como esporte por influência dos irmãos e também para melhorar a insônia e a ansiedade. Ele afirma que, desde que iniciou a prática, os benefícios foram inúmeros, como mais disposição, menos dores físicas e melhora na saúde mental. “Antes de começar a treinar, eu tomava alguns remédios para depressão, ansiedade e insônia. Agora, não tomo mais”, conta.

Segundo Pedro, o maior desafio para os ciclistas é a segurança nas vias. “Não somos muito respeitados, no geral.” O professor compartilha que a convivência com o trânsito não é muito boa e que já passou por dois acidentes. “Um deles me rendeu uma clavícula quebrada em quatro partes. Carrego 10 parafusos e uma placa de titânio para o resto da vida”, relata. O outro foi um atropelamento, quando estava treinando na Segunda Ponte, em alta velocidade, e um motorista bateu na bicicleta dele com o carro, por trás. “A minha sorte foi que ele não passou por cima de mim nem da bicicleta. Esse acidente me rendeu uma fratura óssea também, só que dessa vez no escafoide”, relembra.

A chefe do Núcleo de Campanha Educativa de Trânsito, Graziela Piloni, diz que os acidentes mais comuns com ciclistas envolvem ultrapassagem perigosa feita por veículos nas vias. “Os motoristas precisam respeitar a distância de um metro e meio dos ciclistas. Acontece muito também de os carros fazerem conversão à direita sem sinalizar e, muitas vezes, o ciclista está no ponto cego”, ressalta. “O Código de Trânsito protege o ciclista, mas ele também precisa estar atento, pois é a parte mais frágil no trânsito. Quando não houver ciclovias ou acostamento na via, as bicicletas devem andar na lateral direita no mesmo sentido dos veículos”, orienta.

Investimentos

Está em execução, pelo Governo do Distrito Federal (GDF), o programa Vai de Bike, que irá implantar 270km de ciclovias. O projeto está sendo executado pela Secretaria de Mobilidade (Semob-DF) com a Novacap, o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) e as administrações regionais. 

Além da construção de novas ciclovias, está prevista a manutenção de trechos existentes. “A Semob fez um levantamento, junto às administrações regionais, de mais de 300 ciclovias com necessidades de manutenção e melhorias. Os pontos foram encaminhados aos órgãos responsáveis pela revitalização da malha, visando à elaboração de um contrato de manutenção desses espaços. Em breve, irá começar a recuperação da malha, em parceria com outros órgãos do GDF”, informa o secretário de Mobilidade do DF, Zeno Gonçalves.

O chefe da pasta informou que, como parte do programa, a Semob concluiu a reforma dos trechos cicloviários nas quadras 714 e 715 Norte. “Também foi concluída, pela Secretaria de Obras, a recuperação da ciclovia da W4 Norte, altura da 707/907, e o DER concluiu a ciclovia do Pistão Sul, com 8,8km, e a Ciclovia da Esaf até a Ponte JK, com 1,80km”, completa Zeno.

Estão sendo construídos os trechos cicloviários do Lago Sul, da DF-205 e uma ciclofaixa na região Incra 9 de Brazlândia. Além disso, a obra da ciclovia interligando o Pistão Sul, em Taguatinga, à Candangolândia, passando por Riacho Fundo, Arniqueira e Núcleo Bandeirante, já foi iniciada. A primeira fase da obra contempla um trecho de 9km de extensão. Dentro do programa, 58km de ciclovias estão em obras nas seguintes localidades: Avenida Hélio Prates, EPNB, Lago Oeste, Lago Sul, EPIG, Setor Policial e ligação Guará — Núcleo Bandeirante — Park Way. Ainda no âmbito do programa Vai de Bike, está prevista a implantação de cerca de 3km de ciclovia na DF 001, entre o Recanto das Emas e o Riacho Fundo. (Veja mapa) 

PDTU

Atualmente, a Semob está em fase de atualização do Plano Diretor de Transporte Urbano (PDTU), que está em discussão com a população, juntamente com a elaboração do Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS). No período de 18 de agosto a 4 de setembro, serão realizadas, em todas as 35 regiões administrativas do DF, as oficinas temáticas para discussão das propostas para o transporte e a mobilidade urbana. Um dos temas é a rede cicloviária, com vistas à implantação e à qualificação de infraestrutura segura e contínua para deslocamentos por bicicleta, incluindo ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas.

“A população poderá contribuir, indicando trechos que possam garantir mais conectividade entre as RAs e em seus interiores, com elementos que garantam segurança, conforto e eficiência ao ciclista, e integração aos modos de transporte coletivos. No nosso site e nas redes sociais da Semob, temos publicações das datas e locais de cada RA. A participação de todos é muito importante”, salientou o secretário Zeno Gonçalves.

Saúde

Instrutor de ciclismo e praticante de bicicleta em alta performance há 20 anos, o técnico em segurança do trabalho Helton Rocha Soares, 31, chega a pedalar de Alexânia (GO) até Brasília uma vez por semana, além de outros trajetos diários.

“Eu me divido entre as duas cidades. Trabalho na fábrica de cerveja na BR-060, em Alexânia, e me locomovo para o trabalho 2,5 km ida e 2,5 km volta. Preferi morar perto, na comunidade Parque Alvorada, município de Alexânia”, conta. “Como moro nas duas cidades, faço o translado domingo, no fim do dia, sentido Alexânia, e sexta-feira, pós-expediente, volto para Brasília (Arniqueiras). São 65km cada translado”, complementa. 

Helton participa de competições, como provas de estrada, maratonas e XCO (circuito com obstáculos). Para ele, a prática do ciclismo é um excelente remédio para a saúde mental. “Além disso, temos o privilégio de presenciar e desfrutar do nosso bioma, essa riqueza é imensurável. Isso nos traz aquela manutenção da saúde mental, para que possamos voltar à nossa rotina corrida das grandes empresas”, descreve. 

Palavra de especialista

Uirá Lourenço, usuário de bicicleta no dia a dia, criador do blog Brasília para Pessoas e membro da Rede Urbanidade

Brasília tem grande potencial para a bicicleta, com relevo plano e uma quantidade razoável de ciclovias. É verdade que ainda faltam conexão e iluminação nas ciclovias. Bicicletários espalhados pela cidade, travessias seguras e menor limite de velocidade seriam um grande auxílio aos ciclistas.

Mas o entrave parece ser mais cultural. É preciso largar o carro e testar novos meios, incluindo a caminhada, a bicicleta, o ônibus e o metrô. Mesmo em curtas distâncias o carro ainda é muito usado na cidade. 

Na condição de usuário frequente da bicicleta há mais de duas décadas, posso garantir que ela traz ganhos enormes para a saúde física, emocional e financeira. No trajeto diário me exercito e não estresso na busca por vaga de estacionamento.

Mais pessoas pedalando na cidade significa menos carros, menos poluentes e menos barulho. Nas cidades da Holanda — com muitos caminhos seguros, bicicletários e conexão com trens e ônibus — pessoas de todas as idades pedalam diariamente. Pelas ciclovias também se veem pessoas com deficiência em triciclos e quadriciclos.

O uso da bicicleta no dia a dia, como meio de transporte, tem sido promovido em cidades de todo o mundo. Em tempos de mudanças climáticas, aumenta o apelo por esse meio de transporte simples, barato, silencioso e saudável. Esse é o caminho da mobilidade moderna e a capital federal deve seguir neste rumo.

Mortes no DF

2024 (janeiro a junho): 7

2025 (janeiro a junho): 9

2024 (janeiro a dezembro): 18

Fonte: Detran-DF

Números

1,1 milhão

é o número de bicicletas no DF

727km em 31 RA’s

É a malha cicloviária

 GDF vai implantar

270km

de ciclovias com investimento de

R$ 175 milhões

*Fontes: Federação Metropolitana de Ciclismo do DF (FMCDF) e Secretaria de Mobilidade (Semob-DF)

Por Revista Plano B

Fonte Correio Braziliense           

Foto: Ed Alves CB/DA Press

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