Mulheres de diversas regiões da capital federal fizeram uma manifestação pelo fim da violência gênero na Feira da Torre de TV, neste domingo (7/12). Participaram lideranças de movimentos locais, políticos, ministras e da primeira-dama
Janja da Silva. Duzentas entidades voltadas a causas em prol das mulheres estiveram no ato, que, de acordo com a organização, reuniu cerca de três mil pessoas.O movimento
Levante Mulheres Vivas aconteceu em pelo menos 20 estados, além do Distrito Federal, para denunciar o aumento do número de casos de feminicídio e protestar contra todas as formas de violência dos direitos das mulheres, para que possam viver com liberdade, respeito e segurança. Na capital, em meio aos pronunciamentos e frases como “não queremos flores, queremos viver”, a manifestação também foi marcada pela revolta contra os feminicídios no DF, em especial o 26º caso, ocorrido na última sexta-feira, que vitimou a cabo do Exército Maria de Lourdes Freire Matos, de 25 anos, assassinada por um soldado dentro do quartel onde trabalhavam.A primeira-dama discursou pedindo o fim da violência que atinge mulheres e famílias em todo o país, inclusive, em plena capital do país. “Precisamos de uma legislação mais dura para combater o feminicídio; políticas públicas nós temos, o que falta é vergonha na cara dos homens.”Ao
Correio, Janja mostrou sua indignação sobre a
morte brutal da jovem militar. “O feminicídio cometido contra a jovem
Maria de Lourdes, aqui no Distrito Federal, é mais um caso cruel de apagamento da nossa identidade. Eles nos matam, nos violam, querem nosso fim. Para o assassino de Maria de Lourdes, as facadas que violentamente tiraram sua vida não bastaram. Ele ainda ateou fogo no local, nos deixando um recado claro: querem nossas vidas e nossas histórias aniquiladas”, afirmou a primeira-dama.Janja falou ainda sobre o sofrimento das famílias e o quanto as mulheres estão expostas à violência: “O ódio às mulheres mata diariamente, interrompe sonhos, faz famílias desmoronarem. Espalha dor e sofrimento, deixando mães sem filhas e filhos sem mães, em todas as regiões do Brasil”.Por fim, a primeira-dama comentou a vulnerabilidade das mulheres em todos os lugares. “Cada caso de violência contra as mulheres nos mostra que estamos vulneráveis não só nas ruas, mas em nossos locais de trabalho e dentro de nossas casas. Não podemos mais viver com medo de existir e não vamos nos calar diante da violência sofrida por nenhuma de nós”, conclui.Também ao
Correio, a
ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, destacou que o ato ocorre exatamente em uma semana que termina profundamente triste para o Brasil, com a morte de
Maria de Lourdes. “Esse ato é pela coletividade, pela vida das mulheres, por respeito. É inadminissível seguirmos no país desse jeito. Essa luta é de todos os dias, para nos mantermos vivas, uma luta por todas nós, porque nós queremos viver”, ressaltou.
Sapatos vermelhosSobrevivente de uma tentativa de
feminicidio em 1º de janeiro de 2020, Ana Cleia Holanda levou cinco facadas desferidas pelo ex-companheiro, com quem foi casada por sete anos. Ela ficou meses em cadeira de rodas, com a tíbia fraturada em três lugares, sem movimento em uma das mãos e com perda total de audição de um dos ouvidos. Ela convive, no entanto, com a frustração de saber que o agressor confesso do crime teve a pena convertida para tentativa de homicídio.À reportagem, desabafou: “Eu me sinto extremamente frustrada, nunca recebi recompensa nem por parte do agressor nem do Estado. Sou a primeira mulher que viu uma tentativa de feminicídio ser convertida para tentativa de homicídio simples. Fui vítima, fiquei com sequelas, e meu agressor jamais responderá por tentativa de feminicídio. A Justiça não entendeu essa agressão comigo e com isso, a Lei Maria da Penha, que protege a mulher, é enfraquecida e cada vez mais a violência aumenta”.Hoje, ela dirige a ONG Movimento Social Humanitário Pastora Ana Cleia, que presta apoio a mulheres em vulnerabilidade.Maria das Neves Filha, presidente da União Brasileira de Mulheres do Distrito Federal (UBM), trazia nas mãos um par de sapatos vermelhos, em alusão ao movimento. “Queremos as mulheres vivas, sonhando, lutando, livres para trabalhar, para ir e vir. Esse nosso momento de muita revolta, em que nos sensibilizamos com um conjunto de feminicídios e tentativas. Nessa semana, uma mulher, uma menina ainda, foi morta e carbonizada no Distrito Federal”, lembrou.Os sapatos vermelhos se tornaram símbolo mundial da luta, para lembrar cada vida interrompida de meninas e mulheres. “Esse é o nosso grito, para dizermos que não sofreremos caladas e, por isso, convocamos os homens também para gritar por nós, porque quem nos mata são eles, por causa de uma cultura patriarcal, de ódio e menosprezo. O sapato vermelho representa todas aquelas que não podem estar aqui hoje, pois tiveram sua caminhada interrompida”, completou.
Machismo estruturalClaudia Regina Vieira Lima é presidente do Centro de Formação e Cultura Nação Zumbi, entidade que recebe e capacita cerca de mil mulheres em
São Sebastião. Ela lamentou o fato de mulheres serem mortas todos os dias, simplesmente por serem mulheres. “Basta de feminicídio, chega de nos matarem, é uma vergonha nacional o que vivemos. Nessa sexta-feira, mais uma mulher de apenas 25 tombou e teve sua vida ceifada por um homem. Precisamos nos libertar desse machismo estrutural imposto a nossa sociedade.”“Estamos aqui nesse levante para gravar um marco na história do Brasil de todas as mulheres responderem juntas à sociedade brasileira que não vamos tolerar perder mais nenhuma de nós. Temos mulheres de todas as diversidades neste evento, autoridades e movimentos sociais, em prol da vida. Na sexta-feira, perdemos mais uma mulher, queremos continuar vivas”, disse Ana Carolina Oliveira Tessmann, coordenadora do Levante Mulheres Vivas no DF. Para ela, faltam políticas públicas.O
Levante Mulheres Vivas apontou ainda a fragilidade da rede de apoio e proteção prevista em lei e a disseminação de discursos de ódio contra mulheres nas redes sociais como sendo um agravante do cenário de violência.Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press