O Brasil tem um ativo ambiental invisível, uma das maiores formações naturais de bambu do mundo, localizada no Acre e Amazonas. É consorciada com a floresta, abrangendo uma área no país de 90.000 km2. Contiguamente ela se estende no território peruano com igual superfície.
O bambu é uma planta única, uma gramínea gigante, lenhosa, regenerativa, de alto porte e velocidade de crescimento. É planta sistêmica com vários colmos que se renovam anualmente, o que permite o aproveitamento continuado de sua biomassa ao longo de ciclos de vida normalmente prolongados medidos em dezenas de anos. Existem cerca de 1400 espécies de bambu no mundo, sendo alguns lenhosos, tropicais e de clima temperado, de alto interesse econômico.

Tradicionalmente tem sido usado como alimento, energia e biomassa para diversos fins, destacando-se como substitutivo da madeira de lei.
Com a emergência da crise climática, surge agora a oportunidade de literalmente se descobrir esse ativo. Sua alta capacidade de retirar o CO2 da atmosfera, superior à das espécies arbóreas, e ainda de fixá-lo, evidencia a necessidade de não deixá-lo mais invisível. Oportunidade por ser instrumento altamente eficaz para a descarbonização e a transição energética, além de nos dar outros incomparáveis serviços ambientais.
É bom lembrar que todos os países que desenvolveram a economia do bambu iniciaram pelo aproveitamento de formações naturais. O cultivo veio posteriormente. No caso brasileiro pode-se dizer que essa formação significa uma vantagem comparativa internacional, tanto na descarbonização e transição energética, quanto para o desenvolvimento da economia do bambu no seu todo. Transformá-la em vantagem competitiva é o desafio que se coloca. O sucesso daqui com certeza será indutor do desenvolvimento da economia do bambu em todo. Contribuirá para a organização da sua cadeia produtiva, hoje com alta entropia. O Brasil poderá com isso passar a participar de um setor econômico mundial de ordem superior a US$ 60 bilhões/ano e agregar outros ganhos relevantes na bioeconomia, a dos serviços ambientais.
Hoje já é uma realidade a participação do bambu no mercado oficial internacional de créditos de carbono. Os recursos daí advindos poderão com certeza, viabilizar os investimentos para dar vida a este ativo ambiental e elevar consistentemente os lucros das atividades a ele vinculadas.
No universo do bambu existem hoje milhares de produtos, muitos patenteados, com a incorporação de inovações tecnológicas. A bola da vez é de substituição do plástico.
Entretanto visualiza-se neste primeiro momento, de iniciar o aproveitamento dessa formação, focar nas ações de maior impacto na questão climática. A descarbonização e a transição energética e como consequência. o desenvolvimento local sustentável.
Veja-se. Um manejo adequado da atual formação de bambus proporcionaria um ganho de absorção de carbono de cerca de 30% a mais do que no seu estado natural. Esse manejo impediria o retorno do CO2 a atmosfera em face da deterioração da fração anual de seus colmos. Em dependendo do uso, se transformado em “biochar’ e fixado em solo isso poderia ser maximizado.
Se carbonizado adequadamente para a gaseificação e utilizado na substituição de óleo diesel e /ou combustível na geração de energia elétrica das comunidades ribeirinhas da região, também seriam obtidos ganhos substanciais na diminuição da emissão de CO2, na sua captura e fixação. O mercado da bioeconomia daria um inédito suporte para a viabilização da sua cadeia produtiva.
A tecnologia para isso – carbonização dos colmos recolhidos – é totalmente acessível. Pode ser muito simples com a utilização de fornos rústicos ( Kon Tiki) escavados para o “biochar” de enriquecimento de solos. Ou da pirólise para a torrificação e gaseificação para a geração de energia elétrica. Tecnologia com que se poderia produzir uma carbonização apropriada para filtrar e dar potabilidade a água consumida por essas populações, hoje muitas vezes com resíduos de mercúrio.
Estes usos de rápidas respostas são ainda detentores das maiores facilidades de ingressar no mercado internacional de créditos de carbono. E de obtenção da maior valorização e socialização desses créditos.
Veja-se o exemplo da Planboo Eco, empresa sueca com sócios de diversos países que tem como missão a descarbonização. Sua experiencia e atuação muito bem-sucedida, é certamente a mais inspiradora para as atividades acima.
Em projeto no Sri Lanka inovaram com sucesso, simplificando a metodologia para acessar ao mercado oficial de crédito de carbono (CDRC´s). Constatando que a European Biochar Credit condicionava a concessão de créditos a condição de sustentabilidade da biomassa utilizada para a produção de “biochar” e que uma das quatro categorias em que classificavam a biomassa elegível estava explícito: “biomassa lenhosa, regenerativa e de crescimento rápido como o bambu” identificaram o ovo de Colombo. Pôr em prática as condições especificas exigidas para o processamento da biomassa de bambu em “biochar” e, por metodologia que desenvolveram, estabeleceram a equivalência entre a quantidade de “biochar” produzido e a de carbono sequestrado. Como o “biochar” é fixado no solo, ali permanecendo por tempo ilimitado, obtiveram o valor máximo de créditos no atributo armazenagem do CO2 capturado. A aplicação dessa metodologia foi tornada passível de ser acompanhada remotamente e aprovada pela EBC.
Com isso a ação da PlanbooEco se caracteriza por arregimentar agricultores parceiros para a produção de bambu adequada aos parâmetros pré-estabelecidos e a produção do “biochar”, usando-se fornos simples e acessíveis, porém capazes de contabilizar e enviar dados de produção. E ainda, sendo monitorada e documentada quantitativa e qualitativamente a fixação do “biochar’ no solo, calcula-se o equivalente em toneladas de CO2 sequestrado e fixado. Dado convertido em CDRC´s da EBC e comercializado pelo maior valor do mercado internacional. A Planboo Eco faz estas tarefas complementares, viabilizando a rentabilidade diferenciada dos produtores e por tal, recebe uma comissão pela comercialização destes créditos.
Este grupo atua hoje em vários países asiáticos e africanos.
Considerando que grandes empresas queiram participar deste processo o caminho a ser seguido é o da EcoPlanet Bamboo de Illinois – EUA. Foi a primeira entidade ao ter desenvolvido um sistema verificado para o Monitoramento, Relatório e Verificação dos benefícios de remoção de mudanças climáticas com o bambu. Sua empresa pioneira nisso, a EcoPlanet Nicarágua teve a validação sob o Verified Carbon Standard em 2013 e novamente em 2021.Foram as únicas compensações de carbono de bambu credenciadas no mundo. Hoje tem projetos de carbono de bambu em Gana (2), Ruanda e África do Sul na África e nas Filipinas. Estas fazendas integradas estão removendo e armazenando mais de 12 milhões de toneladas de carbono atmosférico num período de monitoramento de 20 anos e ainda, permitindo a exploração sustentável do bambu.
Desde o início a Eco Planet Nicarágua – a polpa vegetal para a confecção de papel ou tecidos – teve na remuneração pelos créditos de carbono, mais do que um complemento no faturamento da empresa. Demarcou com isso uma nova “moda” na competição de empresas com este perfil. Acredito que nenhuma outra do ramo irá tentar se estabelecer sem buscar a concomitância da remuneração pelos créditos de carbono.
O INBAR Instituo Internacional de Bambu e Rattan, mobilizou cientistas da área e gerou documento com as orientações metodológicas para a inclusão de projetos de plantio e processamento de bambu nas normas exigidas para a certificação e aceitação no mercado internacional de créditos oficiais.
No Acre tem se verificado que áreas destas formações tem sido alvos de incêndios e desmatamento. Como o aproveitamento do bambu pode significar ganhos maiores do que o das pastagens, este contribuí decisivamente para a proteção florestal. Em face de vários exemplos de sucesso no mundo com a utilização do bambu para a recuperação de áreas florestais degradadas, esta utilização pode ainda somar-se as demais ações e aumentar os efeitos positivos no combate a crise climática.
Finalizando torna-se importante destacar os diversos serviços ambientais que diferenciam o bambu e que podem servir aqui ou em qualquer ouro local, considerando-se o plantio do bambu. Contenção de encostas, da erosão, do assoreamento de cursos d´água de superfície; do controle da poluição de superfície; fitorremediação para o tratamento de águas residuais (esgotos) e também para recuperação de solos contaminados (inclusive metais pesados); proteção e recuperação de nascentes; regeneração de áreas florestais degradadas; proteção e recuperação da fertilidade de solos; proteção de áreas sujeitas a enchentes; formação de barreiras quebra-ventos; formação de barreiras acústicas, etc.
Evidencia-se que as ações aqui visualizadas não se restringem somente ao extrativismo sustentável do bambu, mas também ao seu plantio, visando os benefícios da sua ampla oferta de serviços ambientais e a criação de processos locais de alto grau de sustentabilidade.
Há muito apor fazer para se concretizar o aqui exposto. Muito conhecimento, preparos e cuidados para se trabalhar na mata. E isso demanda tempo e investimentos. Acredito que atual momento é o de governos, organizações sociais e o setor privado avaliarem os benefícios possíveis de serem alcançados frente ao que é necessário fazer. Possivelmente aumentar o grau de conhecimentos até se obter a massa crítica destes, capaz de subsidiar a tomada de decisões. Mas antes disso a atitude de se prosseguir em frente ou não com esta idealização. O momento COP 30 pode criar o clima para isso.
Por Arq. Alejandro L.P. da Silva







