Trinta anos separam o Brasil de duas das mais sangrentas operações policiais da história do país. Em 1992, o massacre do Carandiru revelou ao mundo o colapso do sistema prisional brasileiro, com 111 presos mortos após a invasão do Pavilhão 9 por 341 homens da Tropa de Choque. Em 2025, o Brasil revive o espanto diante da operação nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro — uma ação que superou o episódio paulista em número de vítimas e reacendeu o debate sobre o uso desmedido da força pelo Estado.
O levantamento oficial divulgado na terça-feira (28/10) registrava 64 mortos — 60 suspeitos e quatro policiais. Durante a madrugada, moradores da Penha carregaram dezenas de novos corpos até a Praça São Lucas, na Estrada José Rucas, elevando para 132 o número total de vítimas. A Polícia Civil trabalha na identificação dos mortos e na apuração das circunstâncias, já que a megaoperação, que mobilizou 2,5 mil agentes, vinha sendo planejada havia dois meses, para frear a expansão do Comando Vermelho.
No Carandiru, a tragédia durou menos de 30 minutos. Foram 3,5 mil disparos e 111 detentos executados, muitos deles após se renderem. O episódio deu origem ao livro Estação Carandiru, escrito por Drauzio Varella, e à adaptação cinematográfica dirigida por Hector Babenco em 2003, estrelada por Rodrigo Santoro. O filme ganhou projeção internacional e consolidou o massacre como símbolo da violência institucional brasileira.
Três décadas depois, o país volta a assistir a cenas de guerra. A operação na Penha e no Alemão, apresentada pelo governador Cláudio Castro como uma ofensiva contra narcoterroristas, teve confrontos com drones armados e tiroteios intensos. Traficantes lançaram granadas contra as forças especiais da Core e do Bope, e moradores relataram corpos espalhados pela Serra da Misericórdia. A ação terminou com 81 prisões e a apreensão de 42 fuzis.
O governo do Rio reconhece que o Estado não consegue lidar sozinho com o poder das facções. Já organizações de direitos humanos denunciam a banalização da violência e alertam para a repetição de padrões de extermínio. Enquanto isso, novas incursões são planejadas para áreas sob domínio do Comando Vermelho. O principal alvo, Edgar Alves de Andrade — o Doca, apontado como líder da facção na Penha —, segue foragido.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: AFP