O presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) nesta terça-feira (23/9). O presidente falou sobre crise do mutilateralismo, enfraquecimento da democracia, guerras, a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, regulação das big techs, entre outros assuntos. Lula foi aplaudido pelo menos duas vezes durante o discurso.
Bolsonaro
Ao citar a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, Lula disse que “não há pacificação com impunidade”. “Há poucos dias, e pela primeira vez em 525 anos de nossa história, um ex-chefe de Estado foi condenado por atentar contra o Estado Democrático de Direito. Foi investigado, indiciado, julgado e responsabilizado pelos seus atos em um processo minucioso”, disse.
“Teve amplo direito de defesa, prerrogativa que as ditaduras negam às suas vítimas. Diante dos olhos do mundo, o Brasil deu um recado a todos os candidatos a autocratas e àqueles que os apoiam: nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis”, acrescentou Lula.
Democracia
Lula citou a palavra democracia oito vezes ao longo do discurso. No início da fala, ele pontuou que existe um “evidente paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento da democracia”. Depois, o presidente defendeu que mesmo sob ataque sem precedentes, o Brasil optou por resistir e defender a democracia, “reconquistada há 40 anos pelo seu povo, depois de duas décadas de governos ditatoriais”.
“Democracias sólidas vão além do ritual eleitoral. Seu vigor pressupõe a redução das desigualdades e a garantia dos direitos mais elementares: a alimentação, a segurança, o trabalho, a moradia, a educação e a saúde. A democracia falha quando as mulheres ganham menos que os homens ou morrem pelas mãos de parceiros e familiares. Ela perde quando fecha suas portas e culpa migrantes pelas mazelas do mundo. A pobreza é tão inimiga da democracia quanto o extremismo”, frisou Lula.
Guerras
Lula afirmou que “a única guerra de que todos podem sair vencedores é a que travamos contra a fome e a pobreza”. Ele também defendeu que os países reduzam os gastos com guerras e aumentem a ajuda ao desenvolvimento. O presidente ainda lembrou da Faixa de Gaza, Ucrânia, Líbano, Síria, Irã e o Catar.
“Em Gaza, a fome é usada como arma de guerra e o deslocamento forçado de populações é praticado impunemente. Expresso minha admiração aos judeus que, dentro e fora de Israel, se opõem a essa punição coletiva. O povo palestino corre o risco de desaparecer. Só sobreviverá com um Estado independente e integrado à comunidade internacional”, citou. “Bombas e armas nucleares não vão nos proteger da crise climática”, emendou.
Sobre a Ucrânia, Lula destacou que não haverá solução militar no conflito. “O recente encontro no Alaska despertou a esperança de uma saída negociada. É preciso pavimentar caminhos para uma solução realista. Isso implica levar em conta as legítimas preocupações de segurança de todas as partes. A Iniciativa Africana e o Grupo de Amigos da Paz, criado por China e Brasil, podem contribuir para promover o diálogo”, citou.
Internet
Para Lula, a internet não pode ser uma terra sem lei. O presidente argumentou que regular não é restringir a liberdade de expressão, mas, sim, garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim no ambiente virtual.
“Ataques à regulação servem para encobrir interesses escusos e dar guarida a crimes, como fraudes, tráfico de pessoas, pedofilia e investidas contra a democracia. O Parlamento brasileiro corretamente apressou-se em abordar esse problema”, disse.
COP30
“A COP30, em Belém, será a COP da verdade”, disse Lula. O presidente também disse que o encontro será o momento de os líderes mundiais provarem a seriedade do compromisso com o planeta. “Sem ter o quadro completo das Contribuições Nacionalmente Determinadas (as NDCs), caminharemos de olhos vendados para o abismo. O Brasil se comprometeu a reduzir entre 59% e 67% suas emissões, abrangendo todos os gases de efeito estufa e todos os setores da economia”, frisou.
“Em Belém, o mundo vai conhecer a realidade da Amazônia. O Brasil já reduziu pela metade o desmatamento na região nos dois últimos anos. Erradicá-lo requer garantir condições dignas de vida para seus milhões de habitantes. Fomentar o desenvolvimento sustentável é o objetivo do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que o Brasil pretende lançar para remunerar os países que mantêm suas florestas em pé. É chegado o momento de passar da fase de negociação para a etapa de implementação. O mundo deve muito ao regime criado pela Convenção do Clima. Mas é necessário trazer o combate à mudança do clima para o coração da ONU, para que ela tenha a atenção que merece”, continuou.
Pepe Mujica e Papa Francisco
Lula lembrou que, este ano, o mundo perdeu duas personalidades excepcionais: o ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, e o Papa Francisco. “Ambos encarnaram como ninguém os melhores valores humanistas. Suas vidas se entrelaçaram com as oito décadas de existência da ONU”, disse.
Se ainda estivessem entre nós, Lula disse que Mujica e Francisco provavelmente usariam a tribuna da ONU para lembrar os seguintes pontos:
- Que o autoritarismo, a degradação ambiental e a desigualdade não são inexoráveis;
- Que os únicos derrotados são os que cruzam os braços, resignados;
- Que podemos vencer os falsos profetas e oligarcas que exploram o medo e monetizam o ódio;
- Que o amanhã é feito de escolhas diárias e é preciso coragem de agir para transformá-lo.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Michael M. Santiago / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP