Dormir bem se tornou um desafio em um mundo cada vez mais hiperconectado. Um levantamento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revela que 72% dos brasileiros apresentam algum problema relacionado ao sono, como a insônia.
A privação de uma boa noite de descanso está ligada a fatores como excesso de preocupações e uso constante de telas, que mantêm a mente em estado de alerta. Nesse cenário, ganha destaque a higiene do sono, um conjunto de hábitos e comportamentos que ajudam a preparar o corpo e a mente para repousar com qualidade.
“O sono é regido por ritmos biológicos que funcionam em ciclos, assim como as marés dos oceanos. Esses ciclos são profundamente influenciados pelo nosso comportamento diário, e é aí que entra a higiene do sono”, explica o Geraldo Lorenzi Filho, especialista em Medicina do Sono e diretor do laboratório do sono do InCor.
A higiene do sono começa durante o dia
Ao contrário do que muitos pensam, dormir bem não depende apenas do que se faz à noite. Segundo o especialista, a higiene do sono começa de manhã e se estende aos comportamentos durante o dia.
“A gente precisa fazer exercício físico regular, entrar em contato com a luz solar e ter horários definidos para as refeições. Esses são sincronizadores dos nossos relógios biológicos”, afirma o especialista.
O médico ressalta que até a organização da rotina de trabalho influencia: “É fundamental ter hora para começar e hora para parar de trabalhar. O corpo precisa reconhecer esses limites para funcionar em equilíbrio”, destaca.
Passar o dia inteiro dentro de casa, sem exposição à luz natural, é outro erro comum. “O ciclo claro-escuro é um sinalizador importante para o organismo. Ficar isolado da luz do sol bagunça o nosso relógio biológico”, completa.
Desacelerar à noite
Para o especialista em sono, quando a noite chega, a regra é desacelerar. Isso significa jantar em horário adequado, evitar comer imediatamente antes de dormir e adotar práticas que acalmem a mente. De acordo com Geraldo, algumas ações que podem ajudar nesse processo são:
- Ler um livro leve com luz indireta;
- Praticar técnicas de respiração profunda ou relaxamento progressivo;
- Evitar levar o celular ou a televisão para a cama;
- Criar um ritual noturno de desaceleração, como tomar um banho morno ou ouvir música suave;
- Manter o quarto escuro, silencioso e com temperatura agradável.
“Uma leitura leve com luz indireta pode ser um bom recurso para relaxar. Técnicas de respiração e de relaxamento progressivo também ajudam a desviar a atenção e trazer tranquilidade”, sugere Lorenzi.
Segundo ele, um dos grandes erros é usar a cama para atividades que não estão relacionadas ao descanso. “A cama deve ser usada apenas para dormir e para sexo. Comer, ver TV ou usar celular nela cria uma associação errada na mente e dificulta o adormecer”, afirma.
Celular, o grande vilão moderno do sono
Se antes a televisão era apontada como a inimiga número um do sono, hoje o celular ocupa esse posto com folga. “O celular é um grande veneno. Ele ativa a mente e vicia. As redes sociais são programadas por neurocientistas para manter o usuário rolando a tela infinitamente, vendendo sua atenção para quem paga pela propaganda. É literalmente uma tecnologia pensada para viciar”, alerta o médico do sono.
Por isso, para o especialista, a recomendação é clara: nada de telas duas horas antes de dormir. “O ideal seria não ter o celular no quarto, mas eu sei que isso é difícil. O problema é que as pessoas substituíram o despertador pelo celular, e isso cria uma dependência ainda maior”, explica.
Além da estimulação mental, o aparelho também emite luzes e sons que atrapalham o descanso. “Mesmo que você não perceba, o brilho da tela ou um pequeno barulho de notificação já são suficientes para fragmentar o sono”, completa o especialista.
Ambiente adequado para o sono
O espaço físico também influencia diretamente na qualidade do sono. O médico recomenda quarto escuro, silencioso e levemente frio.
“Aqueles pequenos LEDs de aparelhos eletrônicos atrapalham mais do que muita gente imagina. O ideal é eliminar qualquer ponto de luz. Já a temperatura deve ser confortável, tendendo ao fresco, porque ambientes muito quentes prejudicam o adormecer”, afirma o especialista.
Atenção à cafeína
Outro ponto pouco lembrado é o impacto da cafeína. O consumo diário de café, refrigerantes, chás escuros e até chocolate pode estar por trás das noites mal dormidas.
“Muita gente acredita que pode tomar café depois do almoço e ainda assim dormir bem, mas a realidade é diferente. A cafeína age por várias horas e pode atrapalhar o sono mesmo em pequenas quantidades”, explica o Lorenzi.
Ele destaca que não é apenas o café que preocupa: “O chocolate contém teobromina, que é parente da cafeína e também prejudica o sono. O ideal é reduzir ao máximo o consumo de substâncias estimulantes ao longo do dia”, destaca.
Confiar no sono
Para além dos hábitos e do ambiente, o especialista chama atenção para um aspecto psicológico. Muitas pessoas perdem a confiança no próprio sono, e isso cria um ciclo perigoso.
“É muito difícil para quem está constantemente pilhado e conectado acreditar que vai conseguir dormir. A pessoa perde a esperança e a confiança no sono, e quanto mais tenta controlar, mais difícil fica adormecer”, afirma.
Nesse sentido, aprender a se entregar é essencial. “Na hora de dormir, é preciso relaxar. A mente controladora tem que soltar o comando. Essa entrega é um desafio, mas é absolutamente essencial para que o sono aconteça de forma natural”, explica.
O especialista afirma que a higiene do sono deve ser levada a sério. Para ele, não se trata de frescura, nem de modismo, mas sim de saúde.
“Estamos vivendo em um mundo digital que rouba a nossa atenção 24 horas por dia. Se não criarmos estratégias para nos desconectar, o sono será cada vez mais prejudicado. Dormir pouco ou mal não é sinal de produtividade, é sinal de estresse para o corpo”, ressalta Lorenzi.
Por Revista Plano B
Fonte CNN Brasil
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