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Uso político da Lei Magnitsky contra Moraes pode ser levado à ONU

A decisão do governo dos Estados Unidos, sob comando de Donald Trump, de...

A decisão do governo dos Estados Unidos, sob comando de Donald Trump, de aplicar sanções ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), provocou um dos maiores choques diplomáticos entre Brasil e EUA nas últimas décadas. A medida, baseada na Lei Global Magnitsky, gerou reações imediatas no Palácio do Planalto e no STF — e pode agora escalar para o campo internacional. A alternativa, segundo especialistas para contestar a medida, seria o Brasil levar o caso à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA), além de acionar os tribunais norte-americanos.

Segundo o Departamento do Tesouro dos EUA, Moraes teria se envolvido em “detenções arbitrárias” e “supressão de liberdade de expressão” — acusações baseadas em decisões tomadas pelo ministro no contexto dos inquéritos que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Com a sanção, Moraes tem bens e contas bloqueados sob jurisdição norte-americana e está proibido de entrar no país.

Em entrevista ao Correio, o professor João Amorim, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que o Brasil tem base legal para reagir em diferentes frentes. Segundo ele, as sanções violam diversos princípios do direito internacional, como soberania nacional, não-intervenção e igualdade entre os Estados — todos garantidos na Carta da ONU. “A medida é um ataque direto à ordem jurídica internacional. O Brasil pode e deve contestar formalmente”, afirma.

Amorim aponta três caminhos: o primeiro seria provocar judicialmente a Suprema Corte dos Estados Unidos, sob o argumento de uso indevido da legislação federal norte-americana. “A Lei Magnitsky foi aplicada de forma abusiva, sem evidência de violações reais. A Justiça americana pode ser instada a analisar a legalidade da decisão”, explica.

A segunda via seria recorrer à Organização dos Estados Americanos, já que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos garante a independência do Judiciário e veda sanções unilaterais contra autoridades de outros países democráticos. “A OEA pode abrir um procedimento e inclusive emitir medidas cautelares”, diz.

Por fim, o Brasil pode apelar à ONU — ainda que com limitações. “O veto norte-americano no Conselho de Segurança é uma barreira, mas há caminhos na Assembleia Geral e nos relatores temáticos da ONU para direitos humanos e independência judicial. O simbolismo político de uma reação internacional articulada pode ter grande impacto”, ressalta.

Precedente perigoso

A crise provocou também reação do criador da Lei Magnitsky, o empresário britânico William Browder. Ele considera que os EUA estão desvirtuando completamente o espírito da norma. Em entrevista à BBC News Brasil, Browder declarou: “Essa lei foi feita para punir violadores de direitos humanos e corruptos, não para ser usada como vingança política. Aplicá-la contra Moraes mina a credibilidade da legislação e abre um precedente perigoso”.

A Lei Magnitsky foi criada em 2012, inicialmente contra autoridades russas envolvidas na morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou um esquema de corrupção e morreu na prisão. Em 2016, ganhou versão global. Atualmente, mais de 35 países adotam a norma, inclusive Canadá, Reino Unido e União Europeia.

Desde sua criação, a lei tem sido usada para punir autores de crimes sistemáticos, como os responsáveis por massacres em Mianmar ou perseguições contra uigures na China. A aplicação contra um magistrado de Suprema Corte em uma democracia ativa é inédita.

Tensão geopolítica

Para João Amorim, o Brasil precisa agir com firmeza, mas dentro dos limites legais. “Mesmo sem uma versão nacional da Lei Magnitsky, o país pode aplicar medidas de reciprocidade, adotar sanções diplomáticas e liderar uma resposta internacional coordenada. Não se trata de revide, mas de preservar o princípio da legalidade nas relações internacionais”, destaca.

A disputa evidencia o momento de tensão geopolítica vivido desde o retorno de Trump à presidência dos EUA, com uma política externa agressiva e desafiadora às normas multilaterais. A sanção contra Moraes, nesse contexto, seria mais do que uma ação isolada: seria o sinal de que a nova Casa Branca está disposta a impor sua vontade mesmo contra democracias consolidadas.

Por Revista Plano B

Fonte Correio Braziliense      

Foto: Antonio Augusto/STF

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