Unidas por uma sociedade mais acessível e inclusiva, Janaina Parente, 50 anos, e Nazaré Silva, 51, se conheceram em projetos sociais que distribuem solidariedade, escuta e orientação às famílias de pessoas com Síndrome de Down. Mães atípicas, elas sonham com um futuro no qual, não apenas seus filhos, mas todas as crianças com Down sejam respeitadas e tenham seus direitos garantidos, inclusive, no que diz respeito à infraestrutura das cidades.
Foi após o nascimento da filha Aurora, atualmente com 7 anos, que Janaina se engajou na luta pelos direitos das pessoas com Down. “Vi a necessidade de, não apenas me informar melhor sobre a síndrome, como também acolher aquelas famílias que passaram pela mesma experiência de entender e se adaptar ao diagnóstico. Temos, por exemplo, um projeto terapêutico focado na saúde mental dessas mães atípicas, chamado Cuidando de quem cuida, que visa criar essa rede de apoio. Afinal, superação e resiliência são sobrenomes de qualquer mãe atípica”, ressalta.
Por trás do Ápice Down e do projeto Cromossomos do Amor, Janaina e Nazaré, respectivamente, trocam experiências e formam uma grande rede de apoio, capacitando pais em áreas de saúde e educação, promovendo passeios culturais e realizando ações sociais para a comunidade. “Estamos desenvolvendo um projeto revolucionário chamado Casa de Vivências. Será um espaço para atividades terapêuticas e sociais, com sebo de livros, café, oficinas profissionalizantes e auditório, onde essas famílias serão acolhidas”, adianta a mãe de Aurora.
Empatia
Formada em pedagogia, Nazaré trabalha com empoderamento social e mobiliza a comunidade de mães atípicas em prol de um atendimento clínico mais ágil e efetivo para as crianças, possibilitando terapias e exames. No que tange à educação, elas fortalecem seus laços para garantir a inclusão, sem preconceitos, dos pequenos nas salas de aula. “Com a Janaina, reforçamos esses cuidados no apoio emocional às famílias, além de fazermos uma ponte entre Ceilândia (onde Nazaré mora) e o Plano Piloto, oferecendo assistência com olhar humano”, diz a mãe de Samuel José, 11.
O resultado dessa lição de empatia vem, para ambas, em mensagens de carinhos das famílias atendidas. “Perceber que estamos ajudando é, certamente, o indicador mais gratificante”, pontua a presidente do Ápice Down. “Poder acolhê-las (as mães) é transformador e fortalece nossa luta”, completa Nazaré. A dupla recomenda àqueles que desejem ajudar que procurem instituições sérias. “Seja por trabalho voluntário, seja por apoio financeiro, contribuir com esses projetos é positivo para os outros e para si”, conclui Janaina.
Além de lutarem pelas mesmas causas, Janaina e Nazaré têm em comum o carinho por Brasília que, segundo elas, constitui uma miscelânea de histórias e culturas. Natural do Maranhão, a pedagoga chegou à capital com 25 anos e aqui permaneceu. “Sinto-me filha desta cidade, que me acolheu no momento em que mais precisei”, conta Nazaré.
“Temos um dos maiores índices de instrução educacional do país, o que nos torna uma sociedade que busca informação constantemente. Isso é determinante para interagimos com os líderes de entidades e governo. Nascemos dentro do centro do poder e nas vias largas de espaços abertos, tornando-nos íntimos do engajamento social e cívico. Então, quando penso em Brasília, vejo um futuro feito de agentes de transformação da sociedade”, declara Janaina, que nasceu no Plano Piloto e cresceu visitando as feiras da Torre da TV e os shows de rock no Teatro Garagem.
Quadras percursoras
O desejo de mudar a vida das pessoas também move — literalmente — Claudia Chabalgoity, 54, que ensina tênis integrativo para pessoas com deficiência intelectual, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Síndrome de Down e cadeirantes, por meio do projeto Tô no Jogo. A brasiliense, tenista profissional, acumula prêmios em competições nacionais e internacionais, e chegou a representar o Brasil nos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992. A modalidade, segundo ela, ajuda a melhorar a percepção do próprio corpo, trabalhando aspectos como atenção, raciocínio, coordenação e autoestima.
“Durante a transição da minha carreira (Claudia encerrou o trabalho como tenista profissional em 1993), busquei por algo que me fizesse novamente feliz. Então, em 1999, quando conheci o tênis em cadeira de rodas, meus olhos brilharam para o esporte novamente. Era a oportunidade de unir a modalidade a um trabalho social, porque me descobri não competitiva e, sim, colaborativa”, explica a treinadora. Ao engatar neste projeto, Claudia promoveu, por seis anos, o Brasil Open de Cadeira de Rodas, torneio que integrou o circuito internacional de Tênis em Cadeira de Rodas, em Brasília.
Mais tarde, a tenista deu um novo passo na carreira e iniciou a graduação em psicologia. “Nesse período, busquei estudar com mais profundidade o autismo, ainda pouco falado na faculdade. A partir disso, surgiu o Tô no Jogo, com um método integrativo, que une o físico, cognitivo, técnico e energético. Isso porque, quando nos exercitamos, atingimos um equilíbrio energético necessário, principalmente para o autista que, devido às ligações neurais, tem um excesso de sinapses”, diz.
Atualmente, Brasília conta com três núcleos de tênis integrativo — Associação Pestalozzi de Brasília, Ampare e Centro Especial 1 do Guará —, contemplando 80 alunos. “Sinto muito orgulho, pois meu sonho era exportar esse método para o Brasil, de forma que a capital fosse percursora nessa massificação do esporte para pessoas com deficiência intelectual, autismo e Down”. Claudia se deu conta de que o projeto estava ajudando os outros quando começou a ajudá-la também. “Os meus alunos me ensinam todos os dias, pois aprendo virtudes que, nós, neurotípicos, às vezes esquecemos”, constata.
Por Letícia Mouhamad do Correio Braziliense
Foto: Luís Nova/Esp./CB/D.A Press / Reprodução Correio Braziliense