20.5 C
Brasília
quinta-feira, abril 24, 2025

Outros posts

Entre pesos e contratos: como treinar com segurança em academias

Há tempos que a prática de atividades físicas é apontada pelos médicos como...

Há tempos que a prática de atividades físicas é apontada pelos médicos como uma necessidade básica para garantir uma boa saúde física e também menta. Segundo o IBGE, mais de 30% da população brasileira pratica alguma atividade física com regularidade, e as academias são um dos principais locais escolhidos.

De acordo com o sindicato de academias do Distrito Federal, em 2024, cerca de 400 mil alunos estão matriculados em academias da cidade. O setor espera um aumento de 15% nas matrículas em relação ao mesmo período do ano anterior, impulsionado por pessoas que buscam melhorar a saúde e adquirir bons hábitos.

Preocupados em melhorar o bem-estar ou na beleza do corpo malhado, os frequentadores de academias, muitas vezes, não leem com atenção o contrato na hora de realizar a matrícula. Más é justamente naquele papel em que podem estar especificadas algumas exigências como, por exemplo, a apresentação de atestado médico pelo aluno.

Do ponto de vista legal, nenhuma norma no DF obriga o aluno a apresentar um atestado médico para se matricular ou frequentar a academia, somente para as pessoas 70 . Em Goiás, por exemplo, existe uma regulamentação específica que prevê a aplicação de uma espécie de questionário de triagem de saúde, e a apresentação de atestado médico torna-se obrigatória, caso o aluno responda positivamente a alguma pergunta sobre suas condições de saúde.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que práticas como essa só podem ser exigidas se estiverem previstas em contrato ou se forem justificadas por motivos de segurança. Ou seja, a academia pode sugerir, mas não impor essa exigência como condição para o uso dos serviços.

Apesar disso, tanto o Conselho Federal de Medicina (CFM) quanto o Conselho Federal de Educação Física (Confef) recomendam que o aluno passe por uma avaliação médica antes de iniciar qualquer atividade física, principalmente se tiver histórico de doenças crônicas, como hipertensão ou problemas cardíacos.

A academia

Enquanto prestadoras de serviço, as academias têm uma responsabilidade clara: garantir a segurança dos alunos durante os treinos. Isso inclui disponibilizar profissionais habilitados para orientar e acompanhar os exercícios, além de manter os equipamentos em boas condições. Caso o consumidor sofra alguma lesão em razão de negligência por parte dos profissionais das academias, o aluno pode acionar a Justiça.

“Se for comprovado que o acidente ocorreu por falta de orientação ou acompanhamento profissional adequado, o aluno pode acionar a academia na Justiça, pedindo indenização por danos morais, materiais e até estéticos, dependendo do caso. A responsabilidade da academia se estende aos seus funcionários e prestadores de serviço”, explica a advogada Mariana Campos Pedroso, especialista em direito do consumidor.

Caso a pessoa perceba que foi vítima de negligência — falta de cuidado ou diligência que pode resultar em danos a terceiros — por parte da academia, ela pode buscar caminhos, como registar uma reclamação por meio do site do Procon, entrar com uma ação no Juizado Especial Cível, com o cuidado de sempre guardar provas, como fotos, testemunhas, exames médicos e o próprio contrato, para embasar a ação judicial.

Outro ponto importante diz respeito à comunicação entre aluno e academia. É fundamental que qualquer desconforto ou problema sentido durante a prática seja informado imediatamente ao instrutor responsável. “O aluno não pode se sentir constrangido em relatar dores, dúvidas ou inseguranças. O ambiente precisa ser acolhedor e transparente, e isso começa pelo diálogo”, reforça Mariana. Ela lembra ainda que as academias devem manter registro dos atendimentos prestados e das fichas de avaliação física, o que também pode ser útil em casos judiciais.

O retorno

Depois de quase 10 anos sem fazer exercícios físicos com regularidade, a servidora pública de 40 anos, Paula Ribeiro decidiu mudar de vida. Moradora da Asa Norte, ela sempre adiou o início de uma rotina de treinos, seja por conta da falta de tempo, ou pelo receio de enfrentar limitações físicas. Mas, no começo de março, após uma conversa com o clínico geral durante um exame de rotina, ela resolveu dar o primeiro passo.

“Eu me sentia sempre cansada, com dores nas costas e bastante dificuldade para dormir. Meu médico sugeriu a prática de atividade física, mas com cautela, por causa da hipertensão que já existe há séculos na minha família. Foi aí que percebi que não dava mais pra adiar”, conta.

Antes mesmo de procurar uma academia, Paula agendou uma consulta com um cardiologista. Por precaução, fez exames simples, como eletrocardiograma e teste de esforço. O resultado: liberada para treinos leves e moderados, com a recomendação de um acompanhamento profissional.

Paula se matriculou em uma academia de bairro, onde encontrou instrutores simpáticos e dispostos a adaptar o treino à sua realidade. Hoje, ela pratica musculação e faz 30 minutos de esteira três vezes por semana. Os resultados já começaram a aparecer: mais disposição, menos dores e, segundo ela, “uma sensação de bem-estar que estava esquecida”.

“A academia não exigiu atestado, mas, pra mim, foi fundamental fazer essa avaliação médica. Não vejo isso como burocracia, e sim como um cuidado comigo mesma. O atestado não deve ser uma barreira, mas uma escolha consciente”, avalia.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é o órgão responsável por fiscalizar as condições físicas e de higiene das academias, além de verificar também as documentações. Segundo a agência, é importante que os equipamentos devem estar em perfeito estado de conservação, higiene e segurança, não podendo apresentar sinais de enferrujados, rachados, amassados, úmidos ou com qualquer defeito que possa comprometer a prática e a segurança do aluno.

Além disso, a Anvisa orienta que os estabelecimentos devem garantir ventilação adequada nos ambientes fechados, disponibilizar álcool em gel e manter os vestiários e banheiros sempre limpos e organizados. Em tempos de maior circulação de vírus respiratórios, como gripes e resfriados, essas medidas se tornam ainda mais relevantes para preservar a saúde coletiva.

Justiça

O analista de sistemas Renato Silva, de 23 anos, morador do Sudoeste, resolveu intensificar os treinos depois de anos malhando de forma descontraída e, até mesmo, sem compromisso. Mas o que era para ser uma fase de autocuidado virou dor de cabeça.

Durante uma aula de circuito funcional, Renato sofreu uma lesão no ombro ao realizar um exercício com halteres. Segundo ele, não houve correção de postura por parte do professor, que também estava acompanhando outros alunos ao mesmo tempo.

“Na hora senti uma fisgada forte, mas continuei o treino achando que era só esforço. No dia seguinte, não conseguia levantar o braço”, lembra. Após buscar atendimento médico, descobriu que sofreu uma lesão no manguito rotador, que exigiu sessões de fisioterapia e afastamento das atividades físicas por três meses.

Ao procurar a academia para relatar o ocorrido, Renato afirma que foi tratado com indiferença. “Disseram que eu ‘deveria conhecer meus limites’. Não houve nenhum tipo de acolhimento, nem registro do incidente.”

Diante da falta de suporte, ele buscou orientação jurídica e decidiu mover uma ação judicial contra a academia. Com laudos médicos, comprovantes de sessões de fisioterapia e mensagens trocadas com a equipe do local, Renato espera que o caso sirva de alerta para que outros consumidores não passem pela mesma situação. “Não estou em busca de vingança, mas de justiça. Ninguém entra em uma academia pensando em se machucar — a gente vai pra melhorar, não pra sair de lá com sequelas.”

*Estagiária sob a supervisão de Márcia Machado

Por Bárbara Xavier do Correio Braziliense

Foto: Caio Gomez / Reprodução Correio Braziliense

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp